Nos últimos anos, a inadimplência do consumidor teve um impacto significativo no mercado imobiliário, fazendo com que o número de imóveis em leilões quintuplicasse em apenas dois anos. Em 2024, a Caixa Econômica Federal, responsável por 70% dos financiamentos imobiliários no Brasil, colocou 47 mil imóveis em leilão, um aumento expressivo em relação aos 26 mil do ano anterior e aos 9 mil de 2022. Atualmente, cerca de 31 mil imóveis estão disponíveis no site da instituição, com descontos de até 40% nos preços.
Esse fenômeno está fortemente ligado aos efeitos econômicos da pandemia de covid-19. A crise gerada pela pandemia, com alta inflação e desemprego, limitou a capacidade de pagamento da população, que, por sua vez, não conseguiu honrar os compromissos com os financiamentos imobiliários, além de acumular dívidas de condomínio e IPTU. Essa inadimplência resultou na execução judicial dos imóveis, com a intenção de mitigar os prejuízos das instituições financeiras.
Apesar de a Caixa Econômica Federal ter implementado medidas durante a pandemia, como pausas no pagamento e possibilidade de parcelamento das dívidas, os efeitos da crise ficaram evidentes com a normalização do mercado, o que levou ao aumento do número de imóveis colocados à venda em leilões. Henri Zylberstajn, CEO da plataforma de leilões Zuk, destaca que as medidas da Caixa retardaram o processo, criando um acúmulo de imóveis que, com o tempo, acabaram sendo leiloados em um único período.
O especialista André Zalcman, CEO da plataforma Leilão Eletrônico, explica que os imóveis leiloados geralmente não são os mais recentes, mas sim aqueles financiados de 2021 para trás, sendo que muitos podem ter até 15 anos de financiamento. Ele prevê que o mercado de leilões cresceu 23% em 2024 e deve crescer mais 15% em 2025, impulsionado pela inadimplência crescente e o aumento das taxas de juros.
De acordo com dados do Banco Central, a inadimplência no financiamento imobiliário atingiu um pico em 2023, chegando a 1,54%, com destaque para os financiamentos que utilizaram o FGTS. A inadimplência nesse tipo de financiamento passou de 1,99% em 2019 para 2,63% em 2023. Em 2024, o valor médio das parcelas no financiamento com FGTS foi de R$ 590, representando um aumento de 17,5% desde 2019. Já no Sistema Financeiro de Habitação (SFH), que financia imóveis de até R$ 1,5 milhão, o aumento das parcelas foi de 13,43% no mesmo período.
Além disso, houve uma mudança no perfil dos leilões de imóveis, que antes eram exclusivos e presenciais, e agora estão disponíveis online, permitindo maior acesso a uma gama mais ampla de investidores. Em março de 2020, o número de brasileiros inadimplentes era de 64,8 milhões, e em outubro de 2024 esse número subiu para 73 milhões, o que reflete a dificuldade financeira de muitas famílias.
A inadimplência está principalmente associada a dívidas de cartão de crédito (27,9%), água, luz e gás (21,7%) e taxas de condomínio (10,9%). Segundo Fernando Gambaro, especialista em educação financeira do Serasa, o atraso em contas essenciais como aluguel, água e energia indica um grande desbalanceamento no orçamento familiar, já que a moradia é uma das principais prioridades financeiras dos brasileiros. Quando essas contas estão em atraso, é reflexo de um sério problema financeiro.
Em resumo, o aumento no número de imóveis em leilão é resultado direto de uma crise econômica que afetou a capacidade de pagamento dos brasileiros, impulsionada por fatores como inadimplência crescente, alta da taxa de juros, e o efeito residual da pandemia. Esse cenário tem levado muitos brasileiros a perderem seus imóveis, gerando um mercado de leilões mais acessível, mas também mais volátil e arriscado.